Gastrite - a minha, a sua, a nossa, a da cidade inteira

A vida é uma caixinha de surpresas, como já diria Joseph Climber. Assim, o fato de não ter tomado Prozac, ácido nem vodka resultaram naquilo que eu tentei evitar ao pedir demissão: baixei hospital. Três dias. E ainda não sei ao certo o que tenho, mas é bem provável que seja uma gastrite.

Mas isso já é passado, pessoas, e pensemos no lado bom: dietinha forçada de gordura, massas e tal (comi um pedaço de pão e tive a impressão de que um embrião do Alien estava se revirando no meu estômago, pra vocês terem ideia) me trarão um corpitcho que eu desejo. Pena que seja pelo motivo que é, mas tudo bem.

*** ainda não me acostumei com o ideia sem o acento, sinto falta do pobre! ***

Enquanto estive lá - e mesmo antes, claro - o Rio de Janeiro e as pessoas que o habitam nestes dias resolveram dar o ar de sua graça - ou desgraça, melhor dizendo - ao mundo inteiro. Há tempos venho dizendo aqui e pra quem me conhece que o Rio já não é mais o mesmo e que anda insuportável, mas agora todo mundo pode ver isso com seus próprios olhos. E se vocês querem saber qual a maior tristeza que tenho em relação à cidade que eu amo, eu digo: não são os traficantes e a guerra, nem os policiais. Somos todos nós, e eu explico porquê.

O traficante é um marginal, tanto quanto um policial que faça acordo com um traficante. Ambos cometeram crimes e devem ser punidos, estão enquadrados na lei penal. Ok? Ok. Tudo bem que essa coisa de ser preso ou de cumprir pena não é muito bem executada por aqui, mas ao menos você pode espalhar um retrato destes caras como procurados, como criminosos, assassinos, o que seja. Mas e a criança que idolatra um cara destes e sai por aí imitando, com 12 anos de idade, cuja mãe saiu pro baile pra dar prum carinha por aí? E antes que falem de preconceito, mudemos o cenário: uma criança de 12 anos e tal cuja mãe foi prum bar chique do Leblon... pra dar prum carinha por aí? E a mulher que apareceu hoje no jornal coletando cartuchos vazios de um fuzil pra vender e comprar leite? E o cara que assiste a isso tudo na tevê e diz que "é tudo da mesma laia, tem mais é que morrer"? E o playboyzinho que é contra violência mas sobe a favela pra comprar pó ou maconha e dar dinheiro ao tráfico? E os outros playboyzinhos que formam uma gangue pra roubar carrões da moda, sem a menor necessidade, que moram muito melhor que eu? Pra estes, qualquer tipo de punição é pouca ou inexistente, e não me venham com paternalismo barato e/ou oportunista, porque eu aposto que todo mundo que leia isso aqui - TODO MUNDO, mesmo eu - já mandou um "tem mais é que morrer mesmo" ao menos uma vez na vida ou já molhou a mão do policial com uma cervejinha, mesmo estando errado. Repito: nós somos os maiores culpados.

O grande mal do brasileiro (e que é doença crônica no carioca) é o velho ditado de que no cu dos outros é sempre refresco. Cariocas em geral tem a mania de se julgarem "experrtos" demais, mesmo que ser "experrto" signifique burlar uma lei, ignorar uma injustiça ou se fazer valer de uma fraqueza alheia. Isso só gera corrupção, injustiça e esse estado de guerrilha em que estamos por aqui, e se alguém tem que mudar isso, sou eu, é você, somos todos nós. Põe a porra da mão na massa e faz alguma coisa ao invés de ficar reclamando ao vento, com o cu sentado no seu confortável sofá de casa: dê aulas num projeto, distribua alimentos, cumpra a lei, denuncie um crime, mas não espere papai-governo dar solução até pra sua hemorróida. Seja alguém nessa vida.

Eu cansei. Se você também cansou, levanta daí e vamos fazer alguma coisa. Nem que seja uma denúncia anônima, um protesto solitário ou um "não" a um pedido de cervejinha pelo guarda que te parou na blitz - já é o suficiente.

10 comentários:

Júlia Fernanda Maria disse...

Oi, boa noite ;-)

Eu não moro no RJ, mas esta fama de 'ixperteza' deles corre o Brasil todinho mesmo. E realmente os problemas não são causados só pelos bandidos. São, na sua maioria, por pessoas 'de bem' que cometem pequenos deslizes e acham que isso não afeta em nada. Tsc. É assim que começa...

Abraço.

Adriana Calábria disse...

Esse post me lavou a alma!!!

Tempos atrás escrevi um post sobre essa tremenda inércia que assola a todos nós.

Espero que a gastrite melhore logo.

Abraços

Gabriela disse...

Adorei o teu blog sabia!
Beijocas!

Nicotine Caffeine disse...

É possível (ou aconselhável) apaixonar-se, ainda que virtualmente, pela dona de tão singela casinha?

Anônimo disse...

Oi Line, concordo plenamente com o seu post. Hoje, dia 26 de outubro, segunda, o Noblat publicou uma nota bastante parecida com a sua. Olha em http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2009/10/26/quem-se-importa-235385.asp .
Tudo bem?
Bjs e saudades
Grandao

Diane Lorde disse...

Se vc. tá dodoi e esta com esta inspiração toda, imagine quando estiver sadia..srs
Concordo plenamente, se partirmos do princípio em simplesmente começarmos a respeitar as leis e o espaço dos outros já estaremos num bom caminho.
Vamos correr pelo certo porque de coisas erradadas este mundo não precisa mais não.

Marques e Zaine disse...

Olá,
Adoro o seu blog, vivo lendo os seus posts mas nunca tive coragem de comentar. Concordo com você, você é uma das poucas cariocas que nesse momento deixou de lado o provincianismo para julgar corretamente. Somos todos errados e colaboramos com a corrupção nesses pequenos "detalhes". Melhoras.

D.Marco disse...

Quantas moedas, ainda nos sobraram das trinta?

D.Marco disse...

Das trinta, quantas moedas ainda nos sobraram?

Unknown disse...

Eu não tinha visto esse texto ainda.
Aí eu fico me perguntando por que quando eu digo isso, sou uma louca, xiita e revoltada. u,u

Acabou. Boa sorte!

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