Piada Quebrada

Tem uma moça sentada na calçada. Ela olha tudo, mas parece não entender muito bem aquele vai-e-vem de gente na porta da sua casa, porque está sempre com a mesma cara de ponto de interrogação.

Tem uma moça calçada na entrada. Ela pisa, doem os dedos por conta do salto, mas parece não concordar com tantos rostos tristes e preocupados, porque ela sorri e aguarda alguém que ainda não veio, mas vai chegar.

Tem uma moça na estrada, olhando a batucada. Ela mexe os quadris, ensaia um passinho, mas parece ter medo de saber remexer, porque aperta o vestido com força, como se assim pudesse ficar mais quieta.

Tem uma moça cortada no meio da arquibancada. Ela sangra, chora, mas parece não querer ajuda, porque olha pro corte e faz cara de quem se vira sozinha, com orgulho estampado no rosto.

Tem uma moça amada na baixada. Ela sorri, diz que ama de volta, mas parece mentir e ser muito infeliz, porque faz figa atrás de si a cada vez que repete o verbo amar, seja em qual inflexão for.

Tem uma moça calada na madrugada. Ela lê, observa, pensa, reflete e tira suas conclusões, mas parece querer mudar, porque, quando só, fala desesperadamente em voz alta, como se discutindo estivesse.

Tem uma moça aleijada na enxurrada. Ela grita, pede socorro, implora por alguém que a ajude, mas parece não ter a menor esperança, porque seus olhos correm o lugar, mas invariavelmente se fixam no céu, enquanto ela sussura alguma coisa.

Tem uma moça mal-falada na noitada. Ela dança como se não houvesse ninguém, bebe como se não fizesse mal, beija como se não pudesse se apaixonar, mas parece não se importar com a má fama, porque ri como criança e é feliz a cada dia.

Tem uma moça cansada na caminhada. Ela quase se arrasta para acompanhar, reza pra conseguir, mas parece ter certeza de que chegará onde quer, porque mesmo com os pés sangrando e o coração também, ela arruma forças que nem sabia ter e continua andando. Só, no meio da multidão, mas ela não pára por nada. Facada, alfinetada, chuvarada, bofetada, enxadada, garrafada, palhaçada ou paulada, nada vai impedir. Vai chegar ao final da temporada, olhar da sua sacada pra enseada bem na hora da alvorada, sorrindo, sabendo que acabou a sua cruzada. Dando risada - quem sabe mesmo uma gargalhada - e pronta pra porrada.

10 comentários:

Renata disse...

Gostei dessa moça. :)

Helen disse...

Tem uma moça com a cabeça fervilhando por aí...

beijo pra ela :)

Anônimo disse...

Aline, dessa vez você se superou. Adorei! Muito inspirado e também inspirador o seu texto. beijos e parabéns!

Renata disse...

Adorei!

essa moça é uma moça e tanto!

Diego. disse...

tem uma moça que são várias moças, por isso é única!

bj... tri bom teu texto!

Galega disse...

moça nada...um mulherão!

Denise disse...

arrasou.

te quero de vizinha, mesmo!
ando tendo dias de moça da noitada.
nem tão mal falada, mas muito feliz.

Eli disse...

I just LOVED it!!!

Anônimo disse...

belo texto, moça.

.Déa. disse...

me amarrota que eu to passada.

ADOREI!

Absurdamente.

Tem uma moça babando por aqui.... ;D

Acabou. Boa sorte!

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