I must think of a way...

Sozinha, no quarto, ela ouve suas músicas e se põe a pensar em tudo que não tem acontecido em sua vida, em tudo que ainda não conseguiu fazer, em todas as pessoas que ainda não conheceu, os lugares que ainda não visitou, os amores que ainda não viveu. É uma mulher alegre, sim, mas hoje está quieta, calada, quase que invisível no escuro do quarto. Os pensamentos, naquela noite, não eram os mais coloridos, mas a hora do preto-e-branco sempre chega pra todo mundo, então ela pensa e só, sem que nenhum tipo de emoção faça parte daquele processo.

Até que uma música traz vários pensamentos alegres, cheios de cores, sabores, beijos, cheiros e sorrisos: uma dança coladinha, meio que desengonçada, sem roupas nem local especiais - ali, no quarto dela mesmo, de pijama, mas com risos intermináveis causados pela falta de jeito; os risos se transformam em olhares cheios e em beijos carinhosos, em mãos que seguram com força em sua cintura, em suas unhas fazendo um cafuné enquanto beijam; a delicadeza quase infantil e as roupas vão embora aos poucos, como convidados que percebem que a festa acabou pra eles (mas não para os anfitriões), dando lugar então a beijos mais quentes, gemidos indecifráveis e gestos menos gentis, porém muito mais desejáveis, que evoluiriam até que não houvesse mais nada, só um silêncio cúmplice e dois corpos exaustos jogados em cima da cama.

A música termina e ela já não pode mais voltar ao preto-e-branco, está em outra sintonia e, agora, as emoções tomaram conta de todo o quarto. Não consegue pensar em mais nada depois que percebeu que, muito mais do que sozinha, ela está só. Agora, lhe restam as cenas trazidas pela música e o desejo de que fossem reais, ao invés de mais um de seus devaneios. Ela chora, mas seca as lágrimas rapidamente, como se alguém pudesse vê-la e aquilo fosse a demonstração de sua fraqueza. Então, se levanta da cama, desliga o som e resolve dormir, rezando pra que amanhã não se lembre de nada, nem mesmo do quanto aqueles breves minutos de delírio foram bons – aquilo não lhe fez bem, então que suma da memória. Mas quando segue para escovar os dentes, cantarola baixinho, sem nem perceber: I’m going out of my head over you...

Sergio Mendes e Br...

8 comentários:

Eve disse...

profundo e sincero.
cantarolar faz bem, torna mais próximo e possível.

Beijos!

Denise disse...

a música nos transporta pra lugares e épocas escondidos, distantes. é mais poderosa que uma máquina do tempo.
é mágico e bom, mesmo qdo preferimos esquecer...

beijos

ps: a música não está tocando.

Ingrith disse...

Lindo seu texto! Eu amo cantar, mas as pessoas do meu lado não gostam muito de me ver cantando... Na verdade eu canto bem, eles que ouvem mal!

Adorei seu blog.

Renata disse...

Que bonito, Line.

Lembranças às vezes são dolorosas, né? Mas acabamos sendo feitos delas também.

:*

Renata disse...

tb não consegui ouvir a música, mas o conto é ótimo...

é isso mesmo que a música faz, nos transporta pra lugares que muitas vezes não queremos e nem devemos voltar...

Aline disse...

Meninas, agradeço os elogios, de coração =) Mas sinto dizer-lhes que esse é apenas um conto não-autobiográfico... só mais um delírio do meu "escritor", rs.

De qualquer forma, é bom que tenham gostado!

Beijocas!

Aline T.H. disse...

PS: Acho que agora a música toca!

;-)

Aline T.H. disse...

Ingrith, bem-vinda! Me desculpe não ter te respondido antes, viu? Volte sempre!

Meninas, sorry for the rudeness. Tava muito azeda hj, tá?

Beijos a todas.

Acabou. Boa sorte!

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